Espaço virtual que reúne o profissional psicólogo e o escritor amador em rabiscos de caminhos incertos.


segunda-feira, 6 de maio de 2013

No tempo do Smartphone

Um amigo, dia desses, comentou sobre minha disponibilidade para captar situações corriqueiras, que figuram como pano de fundo do fundo do fundo dos nossos trajetos diários, servindo de insumos pra minha escrita.

Observar, examinar, olhar com atenção são pré-requisitos básicos para candidatos a Sherlock Holmes ou verbos usuais de pessoas curiosas e, pejorativamente, fofoqueiras. Talvez por minha tamanha timidez, desde muito pivete, enveredava-me na espionagem do meu pequeno mundo, coletando dados suficientes e adquirindo segurança relativa para encher-me de coragem e, ai sim, pular no interior dos cenários.

Perdia horas admirando desde folhas navegantes que percorriam pequenas corredeiras que se formavam no meio fio após um temporal passageiro, até o divertimento envolvido em transferir pra plateia de uma peça ou filme a minha atenção, pela variedade expressiva que cercava os, agora, atores involuntários.

Cresci, adquiri óculos corretivos, e permaneci observando. De cenas usuais em praças de alimentação, elevadores e salas de espera, noto, reparo e presentifico os acontecimentos em histórias fantasiosas e cheias de tons cinematográficos. A existência apresenta-se em ambientes tridimensionais, onde conecto-me a variedade dos enredos e faço a escolha por afinidade ou reatividade, selecionando a temática com o simples girar de cabeça. Ação, drama, dramalhão, comédia, terror, suspense estão presentes nas apresentações espontâneas e gratuitas nos espaços de livre circulação.

Atualmente, diante de toda a diversidade existente nos ambientes urbanos, verifico uma constância nas exibições. Um novo elemento aparece nestes últimos anos e ganha cada vez mais espaço nas obras do dia a dia, recebendo papéis principais e críticas favoráveis. O multitalentoso smartphone.

É inegável o uso e funcionalidade dos celulares atuais, sendo o mais básico dos seus papéis a realização de ligações. Eu mesmo sou fã da complexidade de suas atuações, onde o mais simples dos modelos disponíveis no mercado cospe fogo, voa, e tem convicções políticas e religiosas.

Com o uso e o envolvimento íntimo, os telemoveis inteligentes obtêm nome, status e roupas, seguem tendências e recebem atenção especial dos seus donos, companheiros, parceiros ou amigos – o grau de intimidade varia de pessoa pra celular.

São objetos depositários de personalidade que encenam papéis variados de livre escolha por quem os dispõem. Vivem a relação a dois, despertam emoções variadas, e tem a capacidade de prender a atenção do parceiro, mesmo numa festa com a presença de outros estímulos. Aliás, é comum vermos um grupo de pessoas, em uma mesa de restaurante ou na tal festa referida anteriormente, em que todos se mantêm fixados na simples troca com seus aparelhos, ‘esquecendo’ todo o entorno. Acontece o chamado tête-à-tête.

E assim, enquanto olho para todos – todos é um exagero literário – e crio este texto, todos olham para ele, seu amigo, parceiro, companheiro... celular.