Espaço virtual que reúne o profissional psicólogo e o escritor amador em rabiscos de caminhos incertos.


sexta-feira, 19 de julho de 2013

Irmão que nasce junto, irmão que nasce separado... muito separado

Quando criança, diante da minha condição de filho único, ansiava ter um irmão. Não consigo precisar, marcar no calendário, o período que acontecera, mas tenho a clara lembrança de que meu desejo foi exposto e imposto para minha mãe que, com sabedoria, acolhia o pedinte, mas não realizava o pedido.

Para mim, pouco importava se meus pais tinham condição de ter outro filho ou se o queriam, afinal, eu antecipadamente elegi-me como o responsável pelo planejamento e elaboração dos afazeres e brincadeiras que nos tomariam o tempo. Claro, que esta realização também não levava em conta que mesmo se os deuses e os anticoncepcionais conspirassem a meu favor, a realidade motora e cognitiva de um recém-nascido dificultaria nossas partidas de futebol.

Enfim, o tempo passou, troquei o irmão por um cachorro – desejo este realizado – e a vida seguiu um curso definitivamente mais especial para mim do que se estivesse dividido o espaço, o quarto, os pais e as broncas.

Por genitores diferentes, ganhara dois primos de primeiríssimo grau. Diferente do Bob – nome do meu presente canino – que precisei implorar e acordar responsabilidades sobre banhos e batismos fisiológicos, meus primos vinham sem pedidos ou ainda promessas. Chegaram e por aqui permaneceram.

Do laço que nossas mães traziam desde a infância, herdamos a frequência do convívio. A matemática era simples: elas encontravam-se e, como resultado, nós, os pirralhos, encontrávamo-nos. Porém, contudo, contanto, todavia a amizade não surgia da ‘forçada’ convivência e com o nascer dos dentes permanentes, já que tínhamos a escolha de engatinhar para lados opostos.

Por opção, passamos infância, passamos adolescência e continuamos passando a ‘adultice’ ligados, apesar dos distantes quilômetros e dos interesses distintos.

Num tempo em que a rede de dormir transformava-se em maquina de lavar, e a pequena piscina Tone – momento propaganda gratuita – agigantava-se ao receber monstros do mar e redemoinhos, primos tornaram-se amigos. Nas fotos e nas lembranças, eles – respeitando a ordem de chegada, um com suas pernas finas e joelhos desproporcionais e o outro, ou melhor, a outra com seus cabelos cacheados – avolumam-se nos álbuns e na memória, dificultando qualquer referência autobiográfica sem ter seus nomes por muito citados.

Da coleção de reminiscências intituladas “criações”, Nando está em sua maioria. Com os jogos de tabuleiro que produzíamos com sobras de cartolina, e com os jogos de quadra que adaptávamos à realidade dos espaços e escassez de material esportivo, tornamo-nos os maiores concorrentes da Grow no distrito de nossas residências. Quando estávamos juntos, imaginação não faltava, e como consequência, as invenções continuavam. De uma banda chamada Mosquitos Aloprados, com curto tempo de vida de um show apenas, até nossas produções em vídeo, com direito a programação jornalística e de entretenimento, o objetivo era o riso fácil, que felizmente nos acompanha até os dias de hoje.

Seguindo... Pra não ter toda atenção da família, mimos e badulaques, que cercam normalmente pimpolhos fofos como eu, Dani não esperou muito e chegou para dividir o foco. Com ela perdi definitivamente as pompas de uma estreia solo, mas ganhei uma parceria pra vida. Apesar da nossa diferença de gênero, nunca experimentamos a usual implicância presente entre meninos e meninas em certas faixas etárias. Pelo contrário, para eu estar com ela, brincávamos de Barbie (que fique claro que eu era o Bob da relação); e para ela estar comigo, brincávamos de Comandos em Ação. Juntos, sempre juntos, enfrentamos o medo do Beto Coelho e do ET cabeçudo do Spielberg; e dividimos os louros e as broncas quando executávamos ideias mirabolantes como encher seu quarto de talco e água para patinarmos.

Assim, após 35 anos, este texto surge pincelado de histórias minhas, que foram cruzadas, permeadas, salpicadas por histórias deles. Surge da lembrança de dois irmãos que vieram por caminhos paralelos, de barrigas diferentes. Irmãos que definitivamente se escolhem.